Quando nos mudamos para cá, há treze anos, para nossa casinha em um bairro residencial de São Paulo, logo notei o pequeno ipê na calçada em frente. Conversando com o antigo morador soube se tratar do amarelo. Disse a ele que essa era uma de minhas árvores favoritas, mas já fui advertida para não esperar por muitas flores.
Contando um pouco sobre a árvore, relatou-nos que embora pequena, a árvore já tinha mais de quarenta anos. Mirradinha, não se sabia o motivo, nunca dava muitas flores, ao contrário de tantos outros ipês amarelos da vizinhança. Determinados a mudar essa situação, por vários anos vertemos aos pés dela todo tipo de adubos, mas, a despeito de nossos esforços, as flores continuaram raras.
Houve alguns anos nos quais ficamos esperançosos, no entanto. Após a queda das folhas, antes dos novos brotos se anunciarem, pequenos botões se arriscavam em promessas de um futuro amarelo. Quando algumas poucas dezenas de flores surgiam, já comemorávamos, conformados pelos méritos do velho ipê.
Neste ano imaginamos que não seria diferente. Vimos quando perdeu cada uma de suas folhas, forrando calçada e asfalto. Não havia sinal aparente de botões de flores, mas em uma manhã notei duas pequenas, reluzentes de tão amarelas. Nos quarteirões dos arredores os outros ipês já estavam plenos, reflexos dos raios do sol.
Durante três dias seguidos as flores foram aumentando lentamente, mas como duram pouco, mal conseguíamos nos dar conta delas. Certo dia, porém, assim que abri a janela da sacada fui tomada de assombro. A arvorezinha estava tomada por flores amarelas e graúdas, além das outras tantas que já formavam um delicado tapete amarelo na calçada.
Rapidamente tratei de registrar em fotos o que me pareceu um espetáculo da natureza e enviei ao meu amigo, antigo dono da casa. O ipê teria florescido pela primeira vez, de acordo com a mãe dele, há 55 anos, nos primeiros dias do mês de setembro. Acredito que seja a árvore mais antiga dessa rua de um único quarteirão. Todas as outras árvores, suas contemporâneas, foram arrancadas, algumas de modo criminoso, lamentavelmente.
Outro ipê na mesma rua, esse de flores roxas, imenso, plantado muito tempo depois da nossa árvore, vive sendo ameaçado por moradores que insistem em afirmar que representa um perigo, mesmo após a defesa civil e outros biólogos terem afirmado o contrário. No início desse ano, inclusive, esteve muito perto de ser derrubado, mas conseguimos impedir a tempo. Curiosamente, nesse mês de agosto, floresceu como nunca antes eu havia visto. Majestoso, derrubou flores sobre tudo e todos, em triunfo.
Há menos de um ano conseguimos que a prefeitura viesse e plantasse outras tantas árvores nesse quarteirão, entre elas vários ipês. Três das árvores plantadas já foram vandalizadas e arrancadas, mas as outras seguem crescendo e acredito que no próximo inverno tenhamos uma rua mais verde e mais florida.
Sei que minha postura de defesa das árvores da rua não agrada a todos, mas sinceramente não me importo. Algumas causas nascem atadas àquilo que somos e nos perseguem até o cerrar de nossas pestanas. Não vou e não quero mudar quanto a isso.
Sinto dizer que, por outro lado, não tenho inspiração para escrever sobre patriotismo nas proximidades de mais um Sete de setembro. Relembro com saudade sobre o tempo em que, criança, nesse dia, eu marchava pelas ruas entoando o Hino Nacional, na ignorância e na ingenuidade de quem acreditava que todos os adultos trabalhavam pelo bem comum.
Meu estandarte, no entanto, sempre será verde, amarelo, azul e branco. Minha bandeira é o verde das florestas, das plantas, da natureza. Luto pelo amarelo dos ipês, pelo direito de contemplar um céu azul livre de poluição e nesse dia, vestir-me-ei de branco, na esperança de que o bem comum, um dia, possa prevalecer sobre todas as maquinações políticas, sobre todas as pequenezas de homens que se pretendem gigantes em uma Pátria tão desamada.