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crime e castigo

Gostem ou não, algumas coisas estão mudando para melhor, mesmo que a passos muito lentos. Há algumas décadas as pessoas falavam abertamente, sem qualquer risco de reprimenda, que iriam jogar filhotes de gatos dentro de um rio ou que levariam animais para longe, para que não soubessem mais como voltar. Toda forma de abandono e de crueldade parecia justificável para alguns e, o pior, na quase totalidade dos casos, não havia o menor risco de punição.

Lamento que ainda hoje haja uma parcela de pessoas indiferentes a essas práticas abomináveis e, pior, que submetem os animais a maus-tratos.

Sei que a questão animalista é muito complexa e passa por discussões éticas, filosóficas, jurídicas e econômicas, o que não caberia no espaço dessa crônica, entretanto penso que vale analisar alguns pontos.

Ainda que aos poucos venham mudando de status, os gatos têm sido, historicamente, alvo de incompreensão e extrema crueldade. Muita bobagem é dita por quem não conhece esses animais incríveis. Gatos são amorosos, inteligentes, apegados aos donos e vivem muito melhor, mais protegidos, se estiverem castrados e sem acesso à rua e aos perigos que ela oferece.

Gatos não oferecem risco de transmissão de toxoplasmose se não estiverem eles mesmos contaminados, o que pode ser descoberto através de exame laboratorial. Risco maior corre quem come salada mal lavada. Mas a ignorância leva muita gente a “aconselhar” grávidas a se livrarem de seus gatos, entre outras coisas idiotices.

É fato que os gatos, se deixados ao abandono, reproduzem-se rapidamente e, realmente, podem virar um problema nos centros urbanos. Reunidos em bandos, caçam e matam pequenas aves, às vezes até causando desequilíbrio ecológico. A urina dos machos, sobretudo, tem odor forte.

Políticas públicas adequadas podem tratar do manejo e castração dos animais abandonados, de modo a controlar suas populações. Sobre o cheiro forte da urina, penso que nem se equipara ao fedor deixado pelos humanos em locais públicos, como praças, por exemplo. Diferente das pessoas, caçam quase sempre para aplacar a fome, ainda que entre seus instintos esteja o de serem caçadores eficientes.

Nada justifica, a meu ver, barbáries como a ocorrida na cidade onde cresci e onde vivem meus pais, no noroeste paulista. Em Lins, há alguns dias, mais de seis felinos, segundo acompanhei pela imprensa, foram encontrados mortos por envenenamento. Diverso do que ocorria no passado, fatos assim não passam mais despercebidos.

Aprovada no ano de 2020, a Lei Sansão (Lei Federal n.14.064) acrescentou um parágrafo ao art. 32 da Lei do Meio Ambiente para fazer constar que, em se tratando de maus tratos contra cães e gatos, a pena é de reclusão de 2 a 5 anos, além de multa e proibição de guarda de outros animais. Além disso, em caso de morte do animal a pena pode ser aumentada de um sexto a um terço.

` Não me cabe, de forma leviana, apontar, nesse caso, suspeitos ou responsáveis pela chacina. Deixo isso ao encargo da polícia que, espero, faça seu trabalho com primor. O que me cabe, contudo, é registrar que fiquei orgulhosa de ver a população linense indignada e exigindo apuração de responsabilidades. Matar animais indefesos, hoje, não é mais ato que encontra eco de aprovação.

Tantas outras medidas poderiam ter sido tomadas para retirada dos gatos do local, mas alguém preferiu tirar-lhes a vida. Confiantes de que estavam sendo alimentados por mãos bondosas, ingeriram o veneno que, de modo doloroso, ceifou deles a existência. Sem ter quem os socorresse, agonizaram sozinhos, inocentes diante da execução sumária.

Quem quer que tenha feito isso deverá pagar de acordo com a lei aplicável, mas por certo sofrerá também a condenação social, vingança de uma sociedade que não aceita mais esse tipo de atitude. Nada do que for feito, por certo, trará de volta os animais assassinados, mas talvez sirva de lição futura para quem se ache intocável ou considere os animais como simples coisas. Crime e castigo, uma equação milenar.

Seja como for, dê uma chance a um felino. Adote um gatinho abandonado e ganhe um amigo, um companheiro para o resto da vida. Às vezes, tudo é uma questão de chances...

Cinthya Nunes é jornalista, advogada, professora universitária, tem cinco gatos e um deles foi retirado das ruas de Lins – Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo./ www.escriturices.com.br