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Dizem por aí que o mundo, de uma forma geral, nunca mais será o mesmo lugar depois do Corona vírus. Eu penso que o mundo muda é o tempo todo e a cada dia que se passa, habitamos em um lugar diferente, em muitos sentidos. Não acredito, infelizmente, que estejamos caminhando para um lugar melhor, mas isso é tema para outra conversa.

O que me parece certo, mais previsível, ao menos no meu caso, é que jamais voltarei a fazer compras da mesma forma. Ir ao mercado se transformou em uma experiência bem peculiar. Mesmo superada a primeira sensação de pavor que tomou conta das pessoas no começo da pandemia, há práticas que já se encontram inseridas no cotidiano e as quais dificilmente, a médio prazo, serão abandonadas.

Aqui em casa, por exemplo, ir ao supermercado demanda a reserva de meio período para isso, tamanha a trabalheira. Tudo começa com a separação de sacolas retornáveis, que são previamente borrifadas com álcool 70°. Chegando ao estabelecimento de nossa escolha e preferência, normalmente um que concilie bom preço e variedade de produtos, temos o carrinho e as mãos devidamente esterilizados também com álcool, agora em gel.

Enquanto luto para respirar sob a máscara, o que me é particularmente difícil, já que minha respiração nasal não é das melhores, tento não colocar as mãos em muitos produtos, senão apenas para coloca-los dentro do carrinho. Se o celular tocar enquanto faço compras, tenho que escolher se deixo que toque ou se terei tempo de higienizar as mãos antes de tocá-lo.

Além disso, ironicamente, olhos, nariz e tudo o mais coçam enlouquecida e inversamente proporcional à possibilidade de se dar a esse deleite. Basta reparar que, estando em casa, com as mãos limpas, não há coceira que se achegue com o mesmo afeto. E se a gente se esquece e coça, fica o tempo todo pensando se não cometeu a maior besteira da vida, dando brechas ao vírus. Se por outro lado conseguimos resistir ao impulso inicial, a coceira só faz aumentar, transformando-se em compulsão.

Compras feitas, é preciso se lembrar de desinfetar o cartão usado para pagá-las. Tudo posto na sacola, mãos limpas de novo para voltarmos ao carro e poder, por fim, verificar quem estava ligando tanto, só para descobrir que era telemarketing. Nessas horas é comum que eu me esqueça de fato se tinha limpado a mão ou se peguei no telefone antes disso. Por via das dúvidas, meto álcool gel no telefone também.

Chegando em casa começa a segunda parte do martírio. É preciso limpar tudo antes de guardar, providência que se estende às sacolas retornáveis, que são borrifadas com álcool para poderem voltar ao armário, descansando até a próxima aventura ao mercado.

Verdade seja dita, agora até está um pouco mais fácil, já que superamos a neura de lavar, enxugar e guardar. Passamos apenas a borrifar álcool em tudo, secar e guardar. Seria o fim se não fosse necessário ainda limpar a pia, trocar de roupa e/ou tomar banho, conforme o que for necessário fazer depois em casa.

E o mais louco de tudo é que não consigo considerar deixar esse ritual de lado, já que mesmo sem corona, quando isso for possível, ainda restarão xixi de rato, baratas e meleca de nariz para tornar impensável simplesmente colocar as compras na geladeira e no armário. Espero apenas, em breve, que ir ao mercado não seja mais uma operação de guerra, permeadas por coceiras impossíveis...

Cinthya Nunes é jornalista, advogada e não tem mais certeza se passou álcool nas mãos antes de digitar esse texto e coçar o nariz – Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.