E lá vamos nós mais uma vez para outro período de eleições. Nesse ano surreal de 2020 estamos às vésperas de eleições municipais. Vereadores e prefeitos serão eleitos para, em tese, representar a população em prol dos interesses coletivos. Festa da democracia? Momento de escolhas decisivas? Infelizmente, ao que me consta, tais perguntas não possuem as respostas mais apropriadas.
Por óbvio que a democracia requer representação e que, em nosso sistema governamental, o modelo requer a escolha de pessoas para gerir a vida e o patrimônio público. A história política nacional, não só a recente, mas principalmente, não é exatamente estimulante para quem deseja ver bem preenchidos os cargos públicos eletivos.
A corrente de corrupção é tão assustadora que faz pensar em tudo aquilo que não foi ainda descoberto. Trilhões de reais desviados para custear luxo de idiotas, analfabetos ou com PHD, pouco importa, às custas da saúde, da segurança e da educação de toda população. E a história se repete e se repete. Uma prisão aqui, uma domiciliar ali, bens e contas bloqueados, várias manchetes de jornal e tv, uma dose de escândalos com denúncias feitas por ex-amantes, ex-secretários, eventualmente uma “queima de arquivo” e, tempos depois, os protagonistas estão por aí, batendo no peito a inocência deslavada e angariando votos para si ou para terceiros.
Engana-se, registro, quem pensar que me refiro apenas a um certo ex-presidente. Quem me dera fosse. Também não faço menção a nenhuma cidade em específico. Escrevo de modo geral mesmo. Para mim, com toda sinceridade, a grande maioria dos políticos se encontra no mesmo saco, sem que um tenha moral para apontar o dedo para o outro. As exceções, de pessoas com comprometimento ou com vontade de realmente fazer algo pela sociedade, acabam eclipsados pelo sistema.
Durante um tempo interessei-me verdadeiramente por política. Como eleitora, durante as últimas décadas, busquei acompanhar de perto algumas pessoas, certa de que havia descoberto um oásis ou uma mísera fonte que fosse. As decepções vieram rapidamente, com notícias dando conta de envolvimentos com esquemas ilegais, vergonhosos.
O período pré-eleições é o que mais me causa repulsa. Não fosse triste, seria hilário. As “plataformas” de muitos candidatos passam do ridículo. Gente que não proposta alguma, que não defende ou representa nada, vai até o rádio, televisão ou qualquer outro meio de publicidade, fazer performances bizarras, expondo-se à vergonha em prol de votos ou de um minuto de fama.
No passado, até onde me recordo, tínhamos (e ainda temos) basicamente a figura do político que saía pelas ruas pegando criancinhas no colo, tirando fotos com idosos e comendo um pastel na feira com o povo. Hoje, em tempos de informação por segundo, de mídias sociais, temos um espetáculo medonho, recheado, em sua maior parte, por gente que sequer sabe quais são as atribuições e alcance dos cargos que pleiteiam. E o pior? Os poucos sérios, que tem algo a dizer, restam sem voz em meio a essa palhaçada toda, desacreditados por parecerem elos de uma corrente apodrecida, contaminada.
Promessas de todas as formas, até de colocar fim ao corona vírus, inundam a sociedade nesses dias que antecedem as eleições. Parece-me, pelo pouco que conheço, que em muitos países se dá a mesma papagaiada. Agora vivemos o tempo das mil possibilidades, mas bastarão dois meses e quase tudo é esquecido. Importará distribuir cargos aos filhos, genros, amigos, pegar comissões de vendas, fraudar licitações, guardar dinheiro na cueca ou sabe-se-lá mais onde.
Os honestos e bem-intencionados que me perdoem. Que Deus os permita algum sucesso, seja de que partido forem. Onde houver honestidade e boa vontade, que chovam votos. Aqui, nessa terra de cegos, nesse país de bandeira manchada pelo fogo e pela corrupção, quem tem um olho é rei.
Cinthya Nunes é jornalista, advogada e lamenta a amnésia política, inclusive da população – Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.