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substrato aquario

​​Foi água para todo lado. Parecia enchente, mas era “só” um dos meus aquários que explodira. Tá, ok, ele não explodiu propriamente, mas o vidro rachou de repente e a água, todos os oitenta litros, começou a sair tal a comporta de uma represa rompida. O susto foi grande, admito. Quando escutei o barulho, achei fosse uma torneira esquecida aberta, ou algo assim. Demorei um pouco para processar o ocorrido e para reagir, pois tinha dois peixes para salvar do contrário de um afogamento.

Nada entendo de astrologia, mas tenho há muito a sensação de que ser do signo de Peixes, de algum modo, atrai água. Consultei o oráculo Google e descobri, através do horário do meu nascimento, que sou Peixes com Ascendente em Peixes. E o que isso significa? Não faço a menor ideia, exceto que provoca um aguaceiro que corre pelo meu verso e pelo meu avesso. A par disso, gosto muito de água, mas a questão é outra. Sou uma espécie de ímã involuntário para esse elemento.

Nessas décadas por mim vividas, venho colecionando histórias, algumas engraçadas, outras nem tanto, nas quais a água é protagonista. Quando a água faz curso por dentro de mim, causando derramamentos em meus olhos, desesperada na fuga, verte silenciosa, mas caudalosa. Não me permito reprimir a força dessas águas, pois o acúmulo delas pode causar dilúvios incontroláveis. De todo modo, sobre elas eu tenho ainda algum controle.

O que me proporciona quase aventuras é a água que circula ao meu redor. Podem apostar que se uma garrafa d’água tiver que cair, será sobre mim ou sobre minhas coisas. Goteiras e vazamentos, historicamente, têm estranha fixação pela minha pessoa. Por cautela, assim, trato rios e mares com respeito, antes que me confundam com um de seus habitantes. Fosse eu sereia, muita coisa estaria explicada, inclusive.

Por outro lado, acho que nasci encantada com seres aquáticos e aquários são, desde sempre, presentes onde quer que eu viva. O recente incidente, com a espontânea rachadura, lembrou-me de outro momento parecido, já distante no tempo, lá pelos idos da infância. Tínhamos um aquário improvisado, minhas irmãs e eu, daqueles redondos. Lá dentro havia muitos peixinhos, de todas as cores e a história de como os pegávamos dá assunto para outro texto. O fato é que havia uma superlotação, mas eu buscava cuidar deles da melhor forma possível.

Trocava a água regularmente, de forma a mantê-lo limpo, coisa que hoje sei que fazia errado, mas eram tempos pré-internet. Em uma dessas vezes, enquanto minha irmã Ivy e eu o carregávamos de volta para casa, ele escorregou de nossas mãos, espatifando-se no chão. Voou peixe para todo lado. Desesperada por salvá-los, comecei a gritar por ajuda, procurando algum lugar para colocá-los a salvo, mas, por azar, não saía água da torneira.

Meu pânico só fez aumentar quando as galinhas que criávamos soltas na chácara dos meus pais, resolveram, curiosas, conferir o que eram aquelas coisas coisinhas pulando para, na sequência, transformar os peixinhos em petisco. Então eu já não sabia se chorava, se tinha medo dos cacos de vidro espalhados pelo chão, se pegava os peixes, se espantava as galinhas ou se corria em busca de água. Como saldo sobraram pouquíssimos peixes e água que me molhou as pernas e os pés, faltando para os peixes, tratou de correr, raivosa e frustrada, pelo meu rosto.

Ao ver, tantos anos depois, que meus peixes corriam risco de serem pegos, agora pelos gatos e cachorras, caso o aquário concluísse seu processo de autodestruição, foi essa a lembrança que me ocorreu em flash. Gritei como se tivesse nove anos outra vez, mas agora havia água e os peixes, enormes, quase pequenas carpas, eram apenas dois.

Dessa vez, tirando o estrago financeiro, salvaram-se todos, à exceção do aquário, que virou sucata. O mar, às vezes, está para peixe, mas às vezes está para galinhas. Os astros explicam. Ou não.

Cinthya Nunes é jornalista, advogada, professora universitária e já está um pouco cansada da chuva que vem caindo há mais de semanas – Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo./www.escriturices.com.br